Há meses por alturas duma festa de verão, no Salão da Liga dos Amigos da Manhenha, relembrei estes cantares – Cantar as Morcelas, neste particular, à moda da Piedade.
Foi o amigo Ilídio Areia – Mestre do Grupo - que me forneceu estes versos que, segundo ele, diferem dos da Ribeirinha, na “toada” e possivelmente nalgumas quadras.
Estão por aí as “matanças de porco” até ao tempo da Quaresma e é bom deixar aqui registado este simbólico repositório de quadras populares, que vem de longos anos numa sã tradição oral e cantada:
Oh senhor dono da casa
Está direito não está torto
Cá tivemos a notícia
Que mataste hoje o porco
Não sabemos se é certo
Assim ouvimos dizer
Se ele está dependurado
Nós gostamos de o ver
Se for da sua vontade
Sei que são uns bons vizinhos
Também ouvimos dizer
Que ele estava bem gordinho
REFRÃO
Oh senhor dono da casa
Tens boa brasa / és cavalheiro
Se queres ser nosso amigo
Dá pão de trigo /vinho de cheiro
Que ele estava bem gordinho
Comeu milho em grão
Esteja magro esteja gordo
Comam com satisfação
Que tinham feito morcelas
E que estavam bem temperadas
Gosto tínhamos com isso
Se elas estivessem assadas
As morcelas estão a assar
Deitando um belo cheirinho
Também lhes quero dizer
Que não se esqueçam do vinho
REFRÃO
Foram duas p’ra lareira
Já devem estar assadas
Agora vamos dizer
Como é que foram temperadas
Com uma coisinha de salsa
Maior porção de cebola
A mulher que as temperou
De certo não era tola
Também lhe deitaram sal
Canela, adubo e pimenta
O sangue que o porco tinha
E uma coisita de malagueta
REFRÃO
Com a gordura das tripas
Cravinho e noz-moscada
Se levaram isto tudo
De certo estão bem temperadas
Como elas foram cozidas
Também lhes quero dizer
Foi dentro de um caldeirão
Com achas debaixo a arder
Tirando-as do caldeirão
Pegando pelo atilho
Andaram com mil cuidados
Pendurai-as no sarilho
REFRÃO
Oh senhor dono da casa
Onde põe o seu chapéu
No meio da sua sala
Parece um anjo do céu
E também sua senhora
Numa cadeira assentada
Parece uma rosa branca
De vermelho salpicada
E também os seus filhinhos
São flores que estão rendendo
Deus lhes dê muita saúde
Como eles estão merecendo
REFRÃO
Oh senhor dono da casa
Isto está bem arranjado
Aguardente não é boa
Sem um figuinho passado
Alegria das matanças
Para jovens e donzelas
Até alegra as crianças
Ouvir cantar as morcelas
Deitei um arco de flores
Por cima dum verde feito
Os senhores nos desculpem
De ser pouco e tão mal feito
REFRÃO
Já no Carmo deu dez horas
Trindades em S. Francisco
Já se vai chegando a hora
De acabarmos com isto
Ainda tenho recordações, vagas, destes cantares, na minha infância nas Lajes…
Voltar para Crónicas e Artigos |